FUGA INTERROMPIDA / FUGA
Programa performativo, 2022 - até o momento
Programa performativo, 2022 - até o momento
FUGA INTERROMPIDA (2022-) é um programa performativo concebido durante a residência artística na Galeria Refresco (RJ, 2022), com curadoria de Daniela Avellar, compreendendo performances, proposições textuais, experimentação sonora e produção audiovisual. FUGA (15', 2024) é um curta-metragem experimental dirigido por viníciux da silva e Raphael Medeiros, fruto da residência no LAB CINEMA EXPANDIDO (DM Filmes, Cinemateca MAM RJ, 2023-2024).
Em junho e julho de 2022, foram apresentadas duas performances (FUGA INTERROMPIDA ATO UM e FUGA INTERROMPIDA ATO DOIS), com Angie Barbosa, Julien Cortes, JARDES, Tuca Mello (1) e viníciux da silva e Tuca Mello e viníciux da silva (2), respectivamente. Concebido a partir da noção de fugitividade, o programa performativo FUGA INTERROMPIDA, em seu primeiro momento, lidava com a redistribuição da violência, a afirmação da vida e a transmutação, gerando, a cada ato, um texto inédito que seria ativado com a performance. Cada performance produz, então, um desenho em algodão, feito coletivamente, enquanto registro da sua efêmera ativação. (Fotografias: Monica Coster, Katianne Berquiolli e viníciux da silva)
Com FUGA INTERROMPIDA, inicialmente, recuso a reencenação como condição para se produzir algum tipo de imagem sobre qualquer tipo de acontecimento. A questão que atravessa parte desta pesquisa é: como imagear a fuga sem reforçar os fundamentos éticos e materiais que a fazem acontecer (isto é, a violência)? Nesse sentido, este não é um projeto que busca, de alguma forma, revisar a história social da fuga ou criar uma representação fiel dela. Longe disso, busco mobilizar a fugitividade, conforme pensada por autores como Fred Moten, Saidyia Hartman e Tina Campt, enquanto fio condutor de uma narrativa que se centra no movimento e nas frequências da fuga. FUGA INTERROMPIDA produz o que Campt chama de “imagens-em-constante-movimento de recusa”. Penso, também, neste projeto como um black gaze. Nas palavras de Campt: “um black gaze transforma [a] precariedade [da vida negra] em formas criativas de afirmação. Ele reorienta a vulnerabilidade e a torna (re)generativa.” Para Campt, trata-se de um fluxo, pois o fluxo permite radicalizar o gaze, permite radicalizar a máxima de Baudrillard: a imagem não é para durar, “é, ao contrário, para melhor desaparecer” (A arte da desaparição, 1997).
"A voz — na verdade, as vozes do ato performático cortejam o fim do mundo como o conhecemos — nas palavras de da silva, o abismo do mundo colonial: “vocês conseguem ouvir?/ O som das minhas profecias,/ vocês conseguem ouvir?”, repetem.
No roteiro comentado, a artista e pesquisadora interveio de modo variado, até que, diferenciando os grifos, construiu legendas próprias. Isto é, ela pode se perder tanto quanto os leitores. E o que interessa em nosso caso, no lugar da performance, é o material que estava destinado ao descarte ou à invisibilidade no espaço privado. Ao mesmo tempo, interessa a desorientação causada pela leitura de material no qual as palavras também pululam, por conta das intervenções, fora das estrofes e das margens."
(Luís Matheus Brito, 2023)
Daqui, desenhamos o mapa do lugar: “o fugitivo é aquele que não se localiza na paisagem ao mesmo tempo em que ele a compõe. O fugitivo não está apagado, é bem diferente disso, pois ele está não localizável pelo olho do Mundo”.
Como, então, tornar-se ingovernável porque sabemos que precisamos escapar desse labirinto colonial sem a mediação das instituições? Fugitividade é “criar as condições para outros modos de vida.”
Originando-se do programa performativo FUGA INTERROMPIDA, o curta-metragem FUGA é o resultado do nosso encontro. É o diálogo entre duas perspectivas da mesma fuga e do mesmo movimento de dissipação. Esse movimento, que reconhecemos fugitivo, é a crítica institucional, a estratégia de sobrevivência, a construção contínua de uma socialidade que excede as barreiras do cativeiro e das forças opressoras.
Inspirado pelo pensamento negro radical, FUGA é um experimento sobre o movimento errático da fuga e sua impossibilidade que produz um jogo de imagens entre dois corpos que habitam suas aberturas, existindo somente em e para além da própria fuga. Nesse sentido, em diálogo direto com as nossas referências — Fred Moten, Tina Campt, Beatriz Nascimento, Christina Sharpe, entre outras — FUGA aposta na “transformação da precariedade em formas criativas de afirmação, reorientando a vulnerabilidade e tornando-a (re)generativa”.
Ficamos com a questão: como imaginar a fuga sem reforçar a violência ética e material que, muitas vezes, condiciona-a? Pensando nisso, FUGA é o resultado dessa reflexão, a tentativa de tomar de volta a possibilidade de uma nova história social da recusa, uma que tem como paradigma a alegria e a liberdade.